Com a palavra, John Lennon: "O REGGAE É FANTASTICO!"

O relacionamento do fab-four com a música jamaicana é antiga e vem ainda dos dias de juventude da turma de Liverpool.
Apesar de desconhecida da grande massa de fãs do grupo, eles nunca esconderam tal influência, porém o mundo queria saber outras coisas daqueles jovens britânicos que mudaram os panoramas do mercado da música mundial entre os anos 60 e 70.


(Ob-La-Di Ob-La-Da lançada no album branco em 1968, além de arranjos que remetem a música da Jamaica, incluiu na letra um personagem chamado Desmond - uma homenagem ao lendário cantor Desmond Dekker)

Alguns exemplos dessa conexão entre Beatles e Jamaica;
George Harrison sempre foi grande fã de Bob Marley e fez questão de conhecer o lendário fundador dos Wailers no backstage de um show no Roxy Club em 1975. A influência musical do Reggae na obra de George pode ser observada em músicas como "Save The World", que é nitidamente inspirada no shuffle jamaicano.

(George Harrison "tietando" Bob Marley nos EUA em 1975)


 

Ringo Starr sempre teve o Reggae como ritmo cotidiano em sua vida, fã declarado do grande rootsman Burning Spear, foi o disco Man in The Hills que ele deu de presente para seu filho Zak Starkey, como porta de entrada para o ritmo de Jah. A paixão e envolvimento com o Reggae por parte       do filho de Ringo ganhou níveis maiores que a do próprio pai, uma vez que ele, hoje, encabeça o projeto batizado de Trojan Jamaica. Espécie de selo dedicado a regravar velhas lendas da ilha e também a encontrar novos talentos ao redor do mundo.



                                   (Shh, Toots Hibbert e o filho de Ringo, Zak Starr)



Paul McCartney estreitou laços ao longo dos anos 70 e 80, com o mago Lee "Scratch" Perry. Interessado pelas produções que saiam do estudio Black Ark no auge da criatividade de Perry, Paul e sua esposa Linda, enviaram faixas do disco de estreia dela, para que Perry pudesse oferecer um pouco de sua magia ao disc. Lee também saiu em defesa do ex-beatle quando ele foi preso no Japão por porte de ganja em 1980, escrevendo uma carta ao primeiro ministro nipônico para que reconsiderasse a prisão do cantor.
  
            (A carta datilografada por Lee Perry e enviada ao primeiro ministro do Japão com o pedido de soltura de Paul)


John Lennon talvez tenha sido o mais militante pró reggae dos 4 Beatles. Durante toda a década de 70, em diferentes shows e entrevistas, ele gostava de frisar a importância do ritmo jamaicano e por vezes, refazia seus clássicos em versões ala Jamaica - como pode ser escutado no audio disponível no youtube, onde em 1972, no show beneficente do comediante Jerry Lewis , ele relê Give a Peace Chance em Reggae e saúda a musica vinda da ilha.


E recentemente descobrimos em um arquivo de uma TV Francesa esta rara entrevista de 1975 com John Lennon.
A traduzimos, legendamos e aqui disponibilizamos esta pequena prova da relação dos Beatles com a Jamaica, através da defesa que John faz não só do Reggae mas também de todo o leque musical que o antecede.

Com a palavra, John Lennon: " O Reggae é fantástico".


A lenda do filme perdido

Every Nigger is a Star foi um filme jamaicano dirigido pela estrela de Hollywood, Calvin Lockhart.
Calvin que nasceu em Bahamas, ficou famoso no período do cinema conhecido como "Blaxploitation" na década de 70, onde o movimento elaborou um sistema de criação baseado na realidade negra, estrelado e dirigido por atores negros.
Na década de 70 Calvin que mantinha residência na Jamaica, resolveu levar o quente mundo do cinema norte americano para a pequena ilha caribenha.
O filme contava a história de um imigrante jamaicano que ao retornar para casa se depara com uma cena local aquecida e cheia de novos artistas.
Para o casting foram escalados nomes como Inner Circle, Big Youth, Fab 5, Boris Gardiner e até mesmo nomes difíceis de encontrar qualquer registro visual, como grande percussionista Count Ossie e o lendário líder espiritual Rastafari Mortimer Planno.
Lançado em 1973 nos cinemas da Jamaica, Bahamas e Nasau, o filme foi um fiasco total.

A desilusão com o filme foi tamanha que ele não foi lançado nos Estados Unidos[epicentro do movimento Blaxploitation] e acabou caindo no esquecimento, nunca tendo ganhado qualquer lançamento em video, seja nas décadas passadas, seja nos dias de hoje.
Em outras palavras o filme Every Nigger is a Star é uma lenda, uma obra que não mais existe.
Diferentes pesquisadores do movimento cinematográfico negro tentaram reencontrar o filme mas pouco conseguiram descobrir, até mesmo seu enredo é virtualmente desconhecido.
Segundo Boris Gardiner, o filme não possuia uma historia forte e tinha um tom muito documental, o que pode ter arruinado sua existência.
Alias, foi da mente de Boris Gardiner que surgiu aquilo que é o maior legado da obra de Calvin Lockhart, a sublime trilha sonora do filme.
Every Nigger is Star que foi arranjada e composta pelo lendário baixista com ajuda de nomes como Leslie Buttler, David Madden, Paul Douglas, Cedric IM Brooks e Tommy McCook, é um passeio musical por ritmos como Funk, Soul e Reggae.
Mas como não poderia ser diferente, o álbum original se tornou uma relíquia, já que sua tiragem foi muito pequena. Até mesmo a reedição alemã de 2010 ganhou poucas cópias, apenas 1500 discos.
Mas por sorte - diferentemente do filme - essa magistral trilha sonora esta disponível no mundo digital, podendo ser escutada nos principais serviços de streaming e também no youtube:
Escute no Spotfy: Every nigger is star

Versão Jamaicana: Lee Perry & Sam Carty

Bird in Hand é uma das mais emblemáticas e aclamadas músicas produzidas pelo mago Lee "Scratch" Perry nos anos finais de seu lendário estúdio Black Ark.

Lançada originalmente no disco "The Return of Super Ape" em 1978, a canção na verdade era uma versão Dub de uma música que não ganhou lançamento a época. 





Apesar de não ter sido lançada em nenhum albúm ou single, ela ganhou força o suficiente para que se tornasse uma especie de hino underground que todo amante de música jamaicana adora lembrar.

Apenas 37 anos após sua gravação, no ano de 2015, finalmente veio a tona uma versão completa da obra, com o lançamento feito pelo selo japonês Drum and Bass Records.

Cantada por Sam Carty, a lingua utilizada para a música sempre foi matéria de discussão, uns escutavam algo de Ámarico[ Etíope] e outros, até mesmo juravam que se tratava de algo vindo da Asia, mas na verdade seus versos são cantada em Hindi, a lingua mais falada da India!

Isso por que a canção foi baseada em uma obra inclusa na trilha sonora de um popular filme indiano da década de 50, “Milte hi aankhein” cantada por Talat Mehmoon e Shamshad Begum para o clássico longa de Bollywood, Babul.





Segundo Sam Carty, um de seus professores na juventude, imigrante indiano, lhe ensinou algumas canções populares de seu país de origem e ele sentiu que uma delas poderia facilmente se tornar um Reggae.

Vizinho de Lee Perry, Carty levou a idéia para o mago mestre, e e ele não só gostou dela como também decidiu que merecia uma arranjo especial. Sua introdução remete ao melodramático enredo do próprio filme indiano, abrindo espaço para um riddim intenso com bateria marcante, a música possui uma cadência hipnótica graças a quase que repetição de seus arranjos, proporcionando ao cantor a base perfeita para sua ladainha.


O resultado foi um dos mais místico números do Roots Reggae, e que mostra o leque de influências que a música da ilha recebeu ao longo dos anos, além de nos oferecer uma visão única da mente criativa dos arquitetos musicais do ritmo de Jah.




Marley antes de Bob - O rei do Reggae antes do estrelato.

Bob Marley foi um destes artistas que passou por este mundo e ofereceu significante mudança ao status-quo através de suas convicções, de sua pessoa e principalmente, através de sua obra – mesmo sendo sua passagem por aqui, tão breve.

E como toda lenda que um dia neste mundo viveu, sua história começa muito antes da obtenção do status de unanimidade. Alias, como toda lenda, sua história de antes do sucesso, é cheia de desventuras, repleta de armadilhas e difícil, muito difícil.

Filho de uma mulher negra de 18 anos com um jamaicano branco de ascendência Siria de 63 anos de idade, Bob nasceu Robert em 6 de fevereiro de 1945, já sem a presença de seu pai, que deixou a família dias após o casamento com sua mãe, Cedella Malcon.

Norval Sinclair Marley mudou-se para Kingston com sua esposa ainda gravida, sob a alegação de procurar sustento para a família, uma vez que seus parentes não só foram contra o casamento, mas como também o deserdaram.

Sua promessa de manter visitas periódicas a mulher gravida, não se tornaram realidade, uma vez que ele esteve na companhia de Cedella apenas 2 vezes durante a gestação, e também não acompanhou o nascimento do filho no distrito rural de Saint Ann Parish.

Sem um pai presente também em seus primeiros anos de vida[segundo a mãe, Robert recebeu não mais do que meia dúzia de visitas ao longo de sua primeira infância], Bob foi separado de sua mãe aos 6 anos de idade, quando seu pai após diferentes propostas de tomar a guarda do filho, resolve propor que a criança fosse morar com ele apenas para ter melhores condições de ensino na capital.

Porém, depois de inúmeras cartas enviadas e não respondidas, Cedella descobre que Norval havia deixado Bob sob os cuidados de uma idosa e que isso fazia parte de um plano, onde, após a morte da cuidadora, ele estaria apto a adotar o filho sem a necessidade de consentimento da mãe e também sem gastar nenhum dinheiro com auxilio.

Malcon junta dinheiro, viaja para a capital e recupera seu filho. De volta ao interior da Jamaica, com ajuda de familiares e com o pouco dinheiro que juntou com os trabalhos na fazenda dos pais e avós, abre uma pequena venda para escoar os produtos ali produzidos, Bob passa ajuda-la após o colégio, recebendo os clientes com velhas canções populares de vendedores jamaicanos, as quais aprendeu em sua breve passagem pela capital.

Aos 10 anos de idade, Marley descobre que sei pai havia morrido e também se separa novamente de sua mãe, que desta vez vai para a capital em busca de melhores condições de trabalho e salario.

2 anos após a mudança, Cedella consegue alugar um apartamento grande o suficiente para ela e o filho, Bob então muda-se para Kingston aos 12 anos de idade.

Na capital Marley passa a viver em uma das moradias populares conhecidas como “tenement Yard” em Trenchtown, vizinhos a família Livingstone, também vinda de Saint Ann Parish. É ai que Bob estreita laços com o amigo Neville, ou como era popularmente conhecido, Bunny.

A dupla rapidamente passa a construir seus instrumentos musicais para se apresentarem pelas ruas da capital, juntos cantavam velhas canções folclóricas e também covers de seus novos heróis musicais, nomes como Curtis Mayfield, Sam Cooke, Jerry Buttler e Fats Domino.

Aos 14 anos Bob desiste dos estudos, mas sua mãe lhe arranja um emprego como aprendiz de soldador, curiosamente, é ali que sua história musical ganha mais um novo capítulo, pois um dos soldadores mais velhos e responsável por lhe ensinar o oficio, era o aspirante a cantor, Desmond Dekker.

Neste período Bob conhece também o popular cantor Joe Higgs, reconhecido por sua dupla com Roy Wilson. 

Joe vivia nos arredores de Trentchtown e passava suas tardes a compor, tocar e a escutar os jovens que ali apareciam para apreciar seus shows particulares e que rapidamente se tornaram, aulas.

Foi ali que eles encontraram outro aspirante a cantor vindo do interior da ilha, Peter Tosh.

Joe Higgs percebeu que aquele trio, somado a duas garotas[Cherry e Beverly] e a destoante voz de Junior Braitwhaite, poderiam formar um grupo bem sucedido, aconselhados pelo mentor musical, eles então formam os Teenagers.

O grupo realizou algumas performances em shows de talentos locais mas nada mais do que isso.

Bob então decidi tentar carreira solo, neste momento, ele que já havia aprendido alguns segredos de composição com Joe Higgs, se arriscava a escrever suas primeiras letras.

O primeiro produtor que ele tenta a sorte é o chinês jamaicano Leslie Kong, dono de restaurante, ele havia começado no mundo na música através do selo Beverly, porém Kong se quer deu chance ao jovem cantor para arriscar uma de suas musicas.

De volta ao trabalho, Marley precisava ajudar no sustento da família, uma vez que uma nova integrante havia chegado, Claudette Pearl, sua irmã, fruto do breve relacionamento de sua mãe com o pai de Bunny.

Desmond Dekker já conhecia as aspirações de Marley e resolveu leva-lo a gravação de um amigo, o jovem de apenas 14 anos de idade que já era um pequeno fenômeno musical, Jimmy Cliff.

Cliff ao ver Bob cantar teve certeza de que seu produtor também gostaria daquilo que ouvirá, assim surge a primeira audição para Marley.

Judge Not foi sua escolha para a sessão com Leslie Kong.

Escolha aceita, meses depois a música estaria na rua e assim surgiria a primeira gravação profissional de Bob Marley, ou como consta nos créditos do disco original, Bobby Martell ou Bob Morley.

Foi também no final de 1961 que aconteceram as gravações seguintes, One Cup of Coffee[releitura de um velho clássico country de Claude Gray] e Terror – sendo esta última, um mistério com relação a sua existência e lançamento.

Bob entra o ano de 1962 com músicas na praça, pouco sucesso e mais problemas pessoais, já que sua mãe havia casado novamente e decidido mudar-se com o marido para os Estados Unidos em busca de uma vida melhor, Marley decidi ficar junto de seu amigo-irmão Bunny, mas logo se desentende com o pai de Livingstone – e pai de sua irmã – deixando a casa sem ter para onde ir.

Foram meses sem um teto para morar, alternando entre as ruas, Marley vivia em situação de desabrigo.

Aos 18 anos de idade, ele consegue então dividir os custos de uma moradia com seu amigo Vincent Ford, só ai que ele resolve voltar a correr atrás de sua carreira musical, dessa vez, novamente com o grupo sugerido por Joe Higgs.

Já rebatizados de Wailing Rudeboys, Vincent apresenta o grupo a um amigo, Alvin “Secco” Patterson era percussionista profissional e havia ajudado o produtor e dono de sound system, Clement “Coxsone” Dodd a formar uma banda para seu recém fundado estúdio, o Jamaican Recording and Publishing Company Limited ou Studio 1, no inicio de 1963.

Secco leva o grupo ao encontro de Dodd e em uma audição de pouco sucesso o grupo é aconselhado a voltar em 3 meses, mas antes de desistir, Peter Tosh diz ao produtor que existe mais uma música e que apesar de não finalizada, poderia o agradar. Coxsone ao escutar a composição que falava sobre a escalada de violência entre os rudeboys após a independência da Jamaica e clamava por mais calma entre os jovens do gueto, decidi que aquela música havia ganhado uma chance, o grupo voltaria em uma semana para as gravações de Simmer Down, acompanhados pelos Skatalites.

Lançada no inicio de 1964, Simmer Down liderou as paradas jamaicanas por meses.

Meses esses que também abriram caminho para mais gravações entre os Wailing Wailers e Coxsone Dodd, outros hits menores também caíram no gosto popular, One Love, Rudeboy e Put It On, foram apenas algumas das inúmeras músicas gravadas e compiladas para o primeiro disco do grupo, lançado em 1966 – sem autorização dos mesmos.

Neste mesmo ano acaba a relação entre os 5 cantores e o produtor do Studio 1, o problema eram os pagamentos, limitados a cerca de 60 dólares por canção e sem direito a royalites, além do trabalho de sempre estarem disponíveis para gravar vocais de apoio para outros músicos da casa.

Por acaso, foi em uma dessas sessões de backing vocals em 1965 que Bob Marley conheceu melhor a enfermeira, professora e cantora, Rita Anderson, parte integrante do grupo Soulettes.

Marley foi encarregado por Coxsone de cuidar da carreira das três cantoras.

Rita conta que ele era um jovem de poucas palavras e sorriso escasso, seu foco era total em sua música. Por isso foi uma surpresa descobrir via Bunny, que seu amigo e produtor, Bob, estava apaixonado por ela.

Meses depois da descoberta da paixão, Rita e Bob se casaram em uma pequena cerimonia em fevereiro de 1966.

Porém meses após o matrimonio, Marley decidi imigrar para os Estados Unidos onde vivia sua mãe e seu atual marido, desiludido com a indústria musical jamaicana, ele tenta buscar um novo caminho para sua vida.

9 meses depois de sua partida, Bob retorna para a Jamaica com uma guitarra e 700 dólares que conseguirá enfrentando trabalhos diversos, que foram de lavador de pratos a motorista de empilhadeira.

Mesmo com conquistas modestas, ele decidi novamente se arriscar no mundo da música e funda sua própria gravadora e loja de discos, a Wail N Soul label & Record Shop.

Wail para Wailers e Soul para Souletes, determinados em não depender de outras pessoas para suas próprias obras, o grupo agora um trio, trata de cuidar das gravações[com apoio do único empregado contratado por eles, Clancy Eccles] e também de levar os lançamentos para os sound system locais, em quanto Rita fica responsável por vender as produções.

Rita e Bob neste período que compreendeu o final do ano de 1966 até o ano de 1970, viveram na fazenda da família, fazendo viagens pontuais para a capital. Rita recorda que Bob passava maior parte do seu tempo entre a composição, o violão, o futebol, a bíblia e curiosamente, escutando muito Jimmy Hendrix.

Em 1967 os primeiros sucessos do selo independente começam a surgir, Nice Time, Hipocrites e Stir it up – escrita por Bob junto de Rita.

Porém um problema com as máquinas de prensa do grupo, comprometeram os próximos lançamentos e com a baixa remuneração da venda dos discos, eles tiveram que entregar a loja e findar sua primeira tentativa de independência musical em 1968.

Não antes de lançar a primeira composição musical de Bob Marley para sua crescente fé no Rastafari.

Bob que já havia tido contato na adolescência com a fé em Selassie, através do acolhimento em acampamentos como Back-o-Wall quando não tinha onde viver, agora se via envolvido de maneira mais estreita com os preceitos Rasta, sendo guiado por Mortimer Planno, um lider espiritual que ministrava aulas de Amarica e também realizava cerimonias religiosas na comunidade de Trentchtown. Foi Mortimer que adaptou a letra de “Crying in the chapel” do grupo Orioles[famosa na voz de Elvis Presley] para ser gravada como um hino devocional em nome de sua majestade imperial, Selassie in The Chapel teve tiragem de poucas dezenas, sendo que a maior parte delas foi enviada para a Etiopia em 1968 pelo próprio Mortimer.

Ainda em 1968 as coisas se tornaram mais difíceis para todos, Peter havia sido preso por protestos contra o governo de apartheid da antiga Rodesia, Bunny passou cerca de um ano encarcerado por porte de Ganja e Bob também foi condenado pelo mesmo motivo, passando alguns meses atrás das grades.

Nos últimos dois anos da década de 60, Bob se dedicou em aprimorar suas conexões espirituais com o Rastafari e mais uma vez guiado or Mortimer Planno, se aproxima do grupo religioso conhecido como Twelve Tribes of Israel.

Em uma cerimonia conhecida como Grounation, Bob e Rita foram apresentados ao cantor norte americano Johnny Nash, recém interessado pelo Rastafari, ele desfrutava de uma temporada pela ilha junto do amigo e sócio Danny Simms.

Sempre interessados em negócios musicais na Jamaica, a dupla recebeu Bob e Rita em sua casa dias depois do primeiro encontro, juntos eles apresentaram músicas como Nice Time e Don’t rock my boat, Nash e Simms gostaram do que ouviram e fizeram uma proposta de representação dos Wailers internacionalmente.

Após um acordo comercial feito pelo líder espiritual de Bob - e também empresário – eles passaram a trabalhar em novas músicas para seus representantes além ilha, e assim que Bunny Wailer sai da cadeira no final de 1968, o grupo se dedica a gravar o material.

Ao todos eles gravaram cerca de 80 novas músicas em 4 anos para a Cayman Music.

Dessas, apenas, menos de uma dezena ganharam lançamentos oficiais pelo selo JAD de Johnny Nash e Danny Simms.

Mellow Mood, Bend Down Low, Nice Time foram algumas que lançadas á época, ganharam uma roupagem nova, na tentativa de tornar o rocksteady, algo mais pop aos ouvidos estrangeiros.

Outras foram lançadas em compilações especiais já nos dias atuais, como Pour Down the Sunshine e Comma Comma. E ainda tiveram aquelas que desapareceram em fitas originais e ganharam lançamentos piratas nos anos 70, como Hammer e Touch Me.

Porém com a frustrante recepção da obra dos Wailers, o grupo foi designado a trabalhar com outros produtores da Cayman Music que não seus cabeças Nash e Simms, o que deixou Bob descontente, o levando a procurar novamente um velho conhecido do showbusiness da ilha, Leslie Kong.

No fim dos anos 60, Kong era o produtor musical mais quente da Jamaica, tudo começará quando ele lança aquela que seria a principal mudança de chave rítmica da historia daquele país, através da música que chamava de Reggae o novo ritmo surgido ali. Era Toots & The Maytals e Do The Reggae.

Novamente trabalhando com o chinês-jamaicano, o grupo grava algumas de suas mais belas obras daquele período, músicas que marcariam para sempre o cancioneiro popular não só da ilha mas como de todo o mundo. Caution, Stop That Train e Back Out foram alguns dos lançamentos da Beverley Records com os Wailers.

Seguindo a mesma ordem de outrora, os lançamentos foram um fiasco comercial e Bob retorna aos Estados Unidos para juntar dinheiro.

De volta a Jamaica no final de 1969, Marley consegue estabelecer a família, agora já com 3 filhos, em uma casa – ainda pequena – melhor em Trentchtown.

O dinheiro não foi o suficiente para que ele pudesse montar o seu próprio estúdio, um sonho antigo, mas o ajudou a fundar novamente um novo selo, agora o Tuff Gong.

Para seus primeiros lançamentos, eles foram atrás de um conhecido dos tempos de Studio 1, Lee “Scratch” Perry.

Juntos, produtor e grupo, gravam Who is Mr. Brown e Duppy Conqueror, usando o estúdio 17, também conhecido como Randys. Apesar da insistência de Perry em lançar a canções por seu selo, Marley preferiu arriscar o seu próprio e recém fundado, e novamente, as músicas não obtiveram boa resposta comercial e abreviando a vida de Tuff Gong – naquele momento.

Em 1970 a parceria continua e resulta em novidades como Kaya, 400 years, Live it up yourself, Keep on moving, African Herbsman, Trenchtown Rock, muitas das vezes lançadas na ilha e também na Inglaterra através de parcerias firmadas por Scratch anos antes, em sua primeira viagem com os Upsetters para a Terra da Rainha.

Porém, mesmo com relativo sucesso, o retorno monetário aos membros do grupo era novamente insatisfatório, o que levou Bob a recorrer a Johnny Nash, que por sua vez, havia feito um convite para que Marley viajasse a Suécia para o ajuda na trilha de sonora de um filme o qual ele era responsável.

Bob abraçou a oportunidade, enquanto ele foi arriscar a sorte pela Europa, Rita foi viver com os filhos na casa de sua sogra nos Estados Unidos, onde trabalhava como enfermeira.

A trilha sonora proposta por Nash acabou não saindo do papel, porém uma tour foi proposta com o apoio de Bob e posteriormente, a promessa de um contrato com a CBS Inglesa, mas para isso ele precisaria reunir os Wailers em Londres para antes gravar um disco de Johnny.

Reunidos em Londres, os três Wailers e também os irmãos Barret, Nash concluiu seu álbum mas seus parceiros não ficaram muito satisfeitos, uma vez que suas acomodações eram deploráveis e seus trabalhos, pouco relevantes para a gravadora, não saíram do papel.

De volta a Jamaica em 1971, os Wailers foram agraciados com o estrondoso sucesso de sua música Trentchtown Rock, além de descobrirem que outras obras, frutos da parceria com Lee Perry haviam ganhado vida e respaldo popular.

Foi o mesmo respaldo que levou o grupo a ser foco dos holofotes políticos locais, sendo assim, Bob e os Wailers decidem participar de uma série de shows batizada de “PNP Musical Bandwagon” em apoio a candidatura do socialista Michael Manley.

No final do mesmo ano, novamente Danny Simms convoca Bob Marley e seu grupo para gravações em Londres mas desta vez com uma promessa mais sólida de contrato.

O grupo voa para o Reino Unido e outra vez sofre com a estrutura oferecida, mas enfim saem os lançamentos prometidos. Johnny Nash estoura com I Can’t see clearly now e os Wailers sofrem com Reggae on the Brodway.

Mesmo assim, Simms consegue uma tour de 2 meses para o grupo em faculdades britânicas. Apesar do relativo sucesso das apresentações, as vendas de discos não alavancaram e os Wailers foram abandonados por Johnny e Danny em Londres, sem dinheiro até mesmo para voar de volta para a Jamaica.

A única coisa que Bob Marley pode fazer naquele momento, foi procurar um velho conhecido de sua obra e da música jamaicana, Chris Blackwell.

Blackwell fundou a Island Records no final dos anos 50 com o objetivo de explorar o aquecido e criativo mercado musical das ilhas britânicas do Caribe.

Island foi responsável por “descobrir” nomes como Laurel Aitken e Millie Small e já havia tentado alavancar Bob Marley através de suas duas primeiras gravações de 1961, comprando os direitos com Leslie Kong, porém não obteve sucesso.

Chris ao reencontrar Bob em Londres, já não era mais um especialista em música caribenha, tendo seu foco agora em bandas de Rock, porém disse a Bob que acompanhava seu trabalho desde o início e a cada passo dado por Marley, ele tinha certeza de que seus caminhos se cruzariam novamente.

Blackwell vislumbrou em Bob a rebeldia que o próprio Rock já não mais possuía, também visualizou que o Rastafari poderia ser o ingrediente secreto do caldeirão criativo dos Wailers e que explorando a música forte do grupo com o visual e mensagem, poderia morar ali um artista explosivo.

Foi assim que Bob recebeu um adiantamento de 8 mil libras[quantia inimaginável para artistas da ilha a época] e um pedido; volte para a Jamaica, encontre o melhor estúdi, grave o que você quiser e volte aqui para produzirmos o primeiro discos dos The Wailers.

E em 1972 nasce Catch a Fire, o disco que marca o início do sucesso de um fenômeno chamado Bob Marley, Wailers e Reggae music.