Skinhead Reggae?

Pode se dizer que todo Skinhead Reggae é Early Reggae, mas nem todo Early Reggae é Skinhead Reggae. Não basta ter sido gravado no final de 1968 pós-rocksteady e com shuffle clássico da guitarra. São muitas coisas fazem um som ser “skinhead”.

Skinhead Reggae é um rico gênero com diversas subdivisões escondidas. Em sua forma mais primitiva, o reggae foi criado por um senhor jamaicano chamado Toots Hibbert em 1968. Mas isso foi só o ponta pé inicial, já  que foi no ano seguinte e em outro lugar que tudo aconteceu.

O boom do genêro na cocorreu na Inglaterra em 1969, ano que o ritmo se consolidou. A maioria das gravações, e com certeza as melhores, foram daquele ano. Diversos outros fatores também ajudaram a formar o tal espírito 69. É mais que uma simples data. Foi o ano em que as diferenças raciais estavam sendo deixadas de lado, a música ganhava cada vez mais força, jovens estavam nas ruas lutando pelos seus direitos em diversos países, o homem alcançava mais espaço do que nunca, ele pisava na Lua.

Uma das levadas que mais marcou esse ritmo foram os tunes ditos de lua, mais conhecidos como “Moonstomp”, o fraseado do baixo repetido constantemente fazia que os jovens da época dançassem imitando um astronauta caminhando na lua lentamente, os Hippy Boys gravaram um tema instrumental chamado “Neil Armstrong”, homenageando o primeiro astronauta que chegou lá.

Mantendo uma levada parecida temos as produções de Laurel Aitken pelo selo Nu Beat da Pama Records, importante gravadora que popularizou o Skinhead Reggae. As músicas gravadas por Laurel nessa época tinham um baixo ainda mais lento e constante do que o "gênero" Moonstomp, chegando a ser até massante de se ouvir por muito tempo, é um som mais cabeçudo, que facilitava a dança dos jovens ingleses. Um exemplo disso é o clássico “Apollo 12” (referência direta ao projeto da NASA “Apollo” que mandava naves espaciais para lua).

Também é necessário reconhecer a importância dos produtores no Skinhead Reggae. Foram eles que tomaram as rédeas do ritmo e começaram a produzir com suas bandas de estúdio instrumentais e versões em seus respectivos selos. Isso fez com que o Skinhead Reggae evoluísse das linhas de baixo marcadas pela distorção da guitarra para belos instrumentais, tendo como principal solista os organistas e seus brilhantes Hammonds. Os melhores produtores sempre estavam a frente de um selo e lançavam seus sons, cada um com sua marca registrada.


AS GRAVADORAS
Duas gravadoras foram responsáveis por manter o Skinhead Reggae no topo dos charts ingleses, a Pama e a Trojan. Sem elas a história do Skinhead Reggae não seria a mesma, talvez esse estilo musical nem chegasse a existir se não fosse os lançamentos das duas, elas estão para o Skinhead Reggae assim como a Motown e a Stax estão para o Soul.

Pela Pama os produtores que se destacaram foram o Bunny Lee com seu selo Unity onde chegou a lançar vários instrumentais, destaque para o inusitado tema “Ivan Hitler The Conqueror”, hammond assassino! Foi das produções de Bunny Lee que saiu o clássico do Skinhead Reggae “Wet Dream” cantada por Max Romeo. Podemos dizer que é um som “skinhead slackness” estilo que Lloyd Chamers também gravou. Esse single do Max Romeo chegou a vender 250.000 mil cópias. O produtor aproveitou a base e também lançou no mesmo riddim a versão com o trombone solando chamada “Daydream” com os Bunny Lee All Stars.
Continuando nas subsidiárias da Pama, uma outra com bem menos lançamentos que a Unity mas com bastante importância foi o selo Success, do produtor jamaicano Rupie Edwards. Aqui também ele mantinha sua banda de estúdio, Rupie Edward All-Stars, que gravava suas versões instrumentais BOSS!.
Foi com Rupie que Gregory Isaacs cantou seus primeiros sucessos nesse novo ritmo, uma delas é a acelerada “Don't Let Me Suffer”.

Uma curiosidade é que Gregory Isaacs em 1969 já cantava com o pseudônimo de Winston Sinclair. Para quem ficou curioso, escute a faixa “Another Heartache” da nossa coletanêa Bak to 69' Vol. 3., reparem também para a rápida guitarra total distorcida.


Nessa mesma época o mestre Lee Perry também produzia bastante música instrumental, nunca mencionando o nome skinhead nas canções mas com a mesma pegada musical. Sua banda de estúdio, Os Upsetters, foi a base da música jamaicana. O grupo tinha na formação os irmãos Barrett além de Glen Adams no órgão e, na guitarra, Alva Lewis, que chegou a cantar alguns rocksteadys no início da carreira. Os lançamentos de Perry pela Pama saiam pelo selo Punch.

Lambert Briscoe dono do sound system Hot Rod situado no subúrbio de Londres, mais precisamente em Brixton, onde moravam muito imigrantes caribenhos, recebeu da gravadora Trojan em 1970 um selo de presente com o mesmo nome de seu Sound, por esse selo ele gravou alguns temas instrumentais que viraram febre entre os skinheads, a base de todos os sons era a banda de estúdio Hot Rod All Stars, dirigida por Briscoe.

Ele também produziu e lançou vários clássicos do Skinhead Reggae pela label Torpedo Records de Eddie Grants, também com sua banda de estúdio Hot Rod All Stars. Com certeza é um dos selos mais consagrados de todos os tempos, pois lançou muito material destinado aos skinheads. Hoje em dia os compactos originais são bem caros, já que são itens obrigatórios na coleção de amantes do gênero, exemplo disso são os boss tunes "Moonhop in London" e a raríssima "A.G.G.R.O".

Outro produtor de sucesso da Trojan foi Joe Mansano, nascido em Trinidad e Tobago. Mansano se mudou para Londres em 1963 e viveu toda a evolução do Blue Beat até a explosão do Skinhead Reggae. O cara tinha uma loja de discos e era tão respeitado nesse meio que recebeu da Trojan um selo com seu nome: “JOE”, responsa né?
A maioria das gravações tinha como banda de apoio os Cimarons, que lançou bons discos de roots anos mais tarde, e também contaria com algumas diferentes formações de músicos de estúdio sob o nome de Joe All Stars.
O trombonista Rico Rodriguez também fazia participações constantes, além das intervenções de Hopeton Reid (Pama Dice), considerado um dos primeiros deejays da história ao lado de Count Machuki e King Stitt.


Fora do eixo Pama-Trojan outros produtores não menos importantes que merecem ser ao menos citados aqui são Leslie Kong (Berveley's), Clancy Eccles (Clandisc), Harry Johnson (Harry J.), Sir Collins (Down Beat), Joe Gibbs (Amalgamated ), Derrick Harriott (Crystal).

Outro nome de peso do Skinhead Reggae foi o produtor/cantor/organista Lloyd Charmers. Ao lado dos Hippy Boys lançou diversos temas instrumentais que eram febre entre os skinheads, o engraçado era que o Reggae feito por Charmers era extremamente psicodélico, com vários timbres de órgão e letras sem nexo algum. Algo bem paradoxal se pensarmos que a cultura skinhead surgiu para diferenciar os hard mods dos mods. Estes últimos que passaram a aderir ao rock psicodélico sessentista que fez a fama dos hippies. Mas isso não tira nenhum mérito de Lloyd Charmers, o som do cara era duma qualidade tão alta que mesmo ele considerando sua música “Psychedelic Reggae” os skinheads continuavam a adorar o som dele, sem dúvida alguma ele foi um dos principais nomes do estilo.

O Skinhead Reggae carrega todo um espírito de rebeldia da juventude, o shuffle da guitarra com a distorção ligada e a batida acelerada se misturam com o hammond segurando as notas mais agudas gerando uma sensação de agitação total. Era esse sentimento que levava os jovens britânicos aos clubs toda semana. A música era a cultura skinhead, e eles amaram esse gênero musical que era feito para eles e que levava o nome deles.


Texto: Luís Cruz (You&Me)
Fotos: Gavin Watson

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