A origem do jazz em Kingston – pré história da música jamaicana



Desde os anos 20, o jazz já se encontrava em evidência na capital jamaicana. Porém nessa época, ainda colônia da Inglaterra, era um privilégio, ou digamos “costume”, apenas dos brancos ouvirem esse tipo de música. Nas comunidades rurais e mais pobres, composta pelos jamaicanos descendentes de africanos e indígenas, a música predominante era a batida folk indígena, o Mento, somada ao canto afro cristão.

              Na alta sociedade jamaicana, como em todas do mundo, a cultura ditava que a música clássica era a que deveria ser apreciada, mas ao mesmo tempo, a música popular norte americana ganhava espaço nos ouvidos do mundo inteiro, independente de classe social. O Jazz foi o gênero que conseguiu nessa época unir o maior número de fãs. Durante os anos 30, algumas bandas locais de jazz já começavam a exportar grandes músicos para Europa, principalmente para UK, é claro. Alguns instrumentistas como o trompetista Leslie Thompson, e o saxofonista Bertie King, já mostravam que eram capazes de tocar jazz em alto nível, rapidamente foram para Inglaterra, e não demoraram muito para dividir o palco com lendas do calibre de Louis Armstrong, em suas passagens pela Europa.

Em Kingston a audiência de jazz já era tão grande que várias big bands começaram a se formar. As big bands lideradas por Whylie Lopez, Ivy Graydon e George Alberga faziam interpretações exclusivas para seus patrões da alta sociedade, já as big bands de Sonny Bradshaw, Eric Deans e Roy Coburn tocavam para platéias dividas por classe social e cor.

Uma nova geração começou a aparecer no cenário do jazz jamaicano nos anos 40, eram músicos que estavam acostumados a ouvir big bands da ilha, mas eram absolutamente influenciados pelo jazz americano tocado nas rádios. Já que a estação de rádio local ZQI não tocava jazz para os fanáticos, esses instrumentistas passaram a sintonizar em rádios dos EUA, como a WLAC de Nashville, WINZ de Miami, por vezes nas rádios de New Orleans, e também na estação de rádio das Forças Armadas, além da BBC na Inglaterra, para ouvir os fenomenais Charlie Parker e Dizzy Gillespie...

Muitos desses instrumentistas da geração de 40 eram meninos orfãos do rigoroso serviço de treinamento musical da Alpha Boys School. Alguns eram garotos rebeldes que recebiam alta qualidade de ensino no instituto, e se mostraram grandes instrumentistas. Os principais nomes que ganhavam destaque e já tocavam nas big bands de Bradshaw e Deans, eram os saxofonistas: Tommy McCook, Wilton Gaynair, Harold McNair e Joe Harriott, além do trompetista Dizzy Reece. Entre os garotos mais novos que já eram respeitados estavam Johnny Moore, Lester Sterling e Don Drummond.

Da geração de 40 que não era da Alpha Boys destacavam-se os trompetistas Roy Burrowes e Sonny Grey, o guitarrista Ernest Ranglin, e os saxofonistas Andy Hamilton e Roland Alphonso. Quando esses garotos já estavam com bastante habilidade, ou se graduando na Alpha, eles acabavam caindo em um terreno complexo, uma nova corrente do jazz moderno pós guerra que havia sido criada por Charlie Parker e Dizzy Gillespie, o 'Bebop'.

Tommy McCook e Ernest Ranglin costumavam tocar nos circuitos de Cuba e Bahamas, e frequentemente retornavam para Kingston para fortalecer a cena local, tanto que os dois são considerados alguns dos criados do Ska. Gaynair, McNair, Burrowes, Reece e Harriott acabaram migrando para Europa e EUA no final dos anos 40 e começo dos 50. Todos tiveram uma carreira notável e respeitada.

Dizzy Reece por exemplo, se tranformou em um importante nome no mundo do jazz. Ele migrou para Inglaterra em 1948 e se estabeleceu por lá, ganhando grande reputação. Além de músico, ele também escrevia livros de história infantil. Muitos músicos de jazz que passavam por Londres encorajavam Reece a conhecer o berço do jazz, os EUA. E foi o que acabou acontecendo, um dos principais incentivadores de Dizzy Reece era ninguém menos que Miles Davis, que costumava dizer, “ele tem alma, originalidade, e acima de tudo: não tem medo de assoprar fogo.” O trompetista jamaicano começava sua carreira ao lado de grandes nomes do jazz moderno norte americano, como Donald Byrd e Dexter Gordon, ambos do selo independente Blue Note, considerado por muitos o mais fino do jazz desde 1939.

Joe Harriott, possivelmente o maior saxofonista jamaicano de todos os tempos, foi um músico muito notável na cena de jazz europeia, é tido por alguns críticos como “pai do free jazz europeu”. Sua excelência e maneira única de tocar o tornou, sem sombra de dúvidas, o maior jazzista da Inglaterra nos anos 60. Ele desenvolveu seu estilo junto com McCook, Gaynair e McNair, mas após se graduar na Alpha Boys, ele passou a tocar nas mais variadas big bands da época e se mostrou um virtuoso. Em 1951, Joe Harriott desembarcou em Londres com apenas 23 anos, para acompanhar a big band de Ossie DaCosta. Após a tour por UK, Harriott decidiu ficar na Inglaterra, onde gravou diversos álbuns e explorou diferentes linguagens do jazz.

Ele contribuiu com sua habilidade, técnica superior e urgência lírica para vários combos de jazz britânicos, incluindo aqueles liderados por Ronnie Scott, Pete Pitterson e o baterista Tony Kinsey. Em 1959, Harriott gravou Sounthern Horizons, seu primeiro álbum como líder, com um quinteto que ele se apresentou no Festival de Jazz de San Remo, na Itália naquele mesmo ano.

Harriott Quintet era composto pelo excelente baixista jamaicano Coleridge Goode. Goode começou a sua carreira no Reino Unido, no tempo de King, De Souza, Thompson e Hutchinson. Em meados dos anos 40 contribuiu com suas graves notas flexíveis como parte da seção rítmica da banda de jazz liderada pelo violinista Stephane Grappelli, e pelo grande guitarrista “cigano” Django Reinhardt. Goode estudou engenharia elétrica na Universidade de Glasgow nos anos 30, mas foi a sua arte no jazz que lhe trouxe notoriedade.

O restante do quinteto era formado pelo trompete e flugelhorn de Ellsworth "Shake" Keane. Nascido na ilha caribenha de St. Vicent, ele estudou Inglês e Literatura na Universidade de Londres, além de um poeta louvável ele é conhecido, sobretudo, como músico de jazz. Seu virtuosismo no trompete encorajou o escritor Ian Carr a comentar: "Sua técnica excelente e as boas variações estavam a serviço de uma imaginação brilhante e imprevisível, que poderia lidar com qualquer coisa do bebop ao erudito contemporâneo, ele podia tocar com austera à abstração total.”

Os outros membros do conjunto de Harriott eram dois ingleses - o competente pianista Pat Smythe, e o excelente baterista Phil Seaman. Mas eram os músicos da diáspora caribenha, no entanto, que formavam o eixo principal da banda. Em 1959, Harriott concebeu um novo formato criativo para o jazz. Enquanto se recuperava no hospital de uma tuberculose, ele formulou um conceito e escreveu composições musicais, de um jazz improvisado, que não requer a segurança de definir padrões rítmicos e harmônicos. Uma vez que Harriott foi liberado pelo hospital, naquele mesmo ano, ele começou a ensaiar essas composições com seu quinteto. As primeiras gravações deste trabalho experimental apareceram no álbum de 1960, Free Form.

O álbum foi lançado após o seminal disco de Ornette Coleman, o vanguardista The Shape Of Jazz To Come, de 1959. Na época, alguns críticos sugeriram que Harriott estava apenas seguindo os passos de Coleman. Hoje, não há dúvida do trabalho de Joe Harriott, ele foi concebido antes de estar ciente do álbum de Coleman - antes da gravação de Coleman chegar às ruas do Reino Unido. Diferentes noções criativas inspiraram a abordagem não-estrutural dos dois saxofonistas. Coleman estava solidamente enraizado em uma estética blues. Harriott, embora ainda fundamentado pelo elemento central do jazz, o blues, junto com Goode e Seaman criaram um balanço, e fizeram-no de forma livre. A fusão do Africano-Caribenho criou sensibilidades e aspectos na vanguarda européia. Até a revista de jazz americana Downbeat favoravelmente analisou o álbum.

O quinteto de Joe Harriott gravou em 1962 o álbum Abstract, e no ano seguinte lançaram o disco Movement, continuando a explorar as diferentes linguagens do jazz. As gravações de Harriott eram revolucionárias para os fãs mais convencionais do UK jazz, mas ao mesmo tempo, na América, ele ganhava o status de underground, certamente pelos entusiastas do avant-garde. Apenas três anos depois da gravação de Movement, Harriott começou a colaborar e produzir outras inovações no UK Jazz. Em 1966, Joe Harriott Quintet se fundiu com uma banda de cinco homens liderados pelo violinista clássico John Mayer, ele construiu ritmos e melodias com instrumentos oriundos da Índia, como a tabla, o sitar, tambura, flauta, violino e o cravo. O resultado do duplo quinteto foram três álbuns intitulados: Indo-Jazz Suite, Indo-Jazz Fusions I e Indo-Jazz Fusions II, e consequentemente, fizeram turnê juntos. A união dessas bandas produzia com ecstase a fusão e combinação da música indiana, tocada por anglo-indianos junto com músicos da vanguarda do jazz inglês e solistas afro-caribenhos, que formavam uma anomalia cultural que só os anos sessenta poderia ter criado.

Depois de sua morte prematura aos 44 anos em 1973, todo o legado de Joe Harriott caiu em um esquecimento obscuro difícil de ser entendido. Talvez por ser filho da colônia inglesa, uma ilhota do terceiro mundo, ele não tenha recebido o devido valor, ou talvez, por despontar no cenário do jazz britânico onde a maioria dos músicos era composta por brancos. Na verdade não da para saber, pode ser até pelo grau de complexidade e variações de linguagens que sua obra alcançou que Harriott tenha sido esquecido pelo público, mas com certeza os amantes de jazz sabem do seu tamanho e importância para o desenvolvimento do gênero, sobretudo para seu público jamaicano, caribenho e inglês, onde ele é tido como um ícone.

As jovens estrelas do jazz na Jamaica se dividiam em dois grupos durante os anos 40 & 50. O grupo dos que saíram da Jamaica para ganhar espaço em outros países, inspirados pelos jazzistas americanos, mas com excessões, como o inovador Joe Harriott. E o grupo dos que ficaram na Jamaica e desenvolveram os ritmos jamaicanos que conhecemos hoje. Desde o Ska até o Reggae, Roland Alphonso, Lester Stearling, Don Drummond, Johnny Moore não saíram do seu país de origem durante este período. Coxsone Dodd produziu dois discos de jazz com alguns desses músicos em seu próprio selo Port-o-Jam em 1962.

O arranjador e excelente músico Ernest Ranglin, que inclusive trabalhava para Coxsone nessa época, foi um dos fundadores do Ska. Ele também gravou álbuns para o selo inglês Island. Guitar In Ernest, conhecido também como Reflections, que foi lançado em 1963. Ele viajou para Inglaterra e gravou o disco Wranglin', também para Chris Blackwell, se mostrando um jazzista de mão cheia, resultado foi que o convidaram para tocar no Ronnie Scott's Jazz Club em 1964.

Tommy McCook havia se mudado para Nassau nas Bahamas em 1954, pois tinha recebido um convite do Zanzibar Club junto com Ranglin e outros músicos jamaicanos. McCook ficou nessas idas e vindas a Nassau durante oito anos. Nesse período, Tommy fez sua primeira viagem para os Estados Unidos, em 1956. Foi na Flórida que ele entrou em contato com a música de um outro grande saxofonista tenor que vinha crescendo muito, seu nome era John Coltrane. Nessa época Coltrane mantinha um lirismo melódico, considerado cool, que gerou muita inspiração no estilo de Tommy McCook. No ano de 1962, Tommy retorna definitivamente para Jamaica, no fervoroso ano de independência, passando a tocar regularmente em festas na capital Kingston.

Ele logo inicia seu contato com a nova indústria musical da ilha, mas não com o Ska, e sim com um álbum exclusivo de Jazz produzido por Coxsone Dodd. Era o novo ritmo chamado Ska que vinha aparecendo no país, mas como um amante de jazz, Coxsone achava tempo para produzir música para os ouvidos que ainda não tinham se acostumado com o novo ritmo. Ele produziu dois discos com os mais talentosos músicos de jazz, o primeiro I Cover The Waterfront de 1962, gravado pelo quinteto de Cecil Lloyd. Pianista e líder do grupo, Cecil Lloyd estudou na escola Juilliard em NY. A seção rítmica era formada pelo baterista Lowell Morris e o baixista Lloyd Mason, que nunca traduziu seu talento para o Ska, mas que era acompanhado pelo sax tenor de Roland Alphonso e o trombonista Don Drummond, duas das principais cabeças, do que viria a se tornar, o maior grupo da história da música jamaicana, os Skatalites.

O segundo álbum, gravado no ano seguinte e intitulado Jazz Jamaica at the Workshop, tinha também na sua base os melhores jazzistas do ramo, apareciam no line Cecil, Lloyd Mason, Roland, Don Drummond, Carl McLeod na bateria, e o trompetista Billy Cooke. Ernest Ranglin e Tommy McCook completavam o time, aparecendo como principais solistas. O disco introduzia quatro composições originais, “Serenade in Sound” e “Mr. Propman” escritas por Don Drummond, “The Answer” de McCook, e por fim, “It Happens”, tema de Cecil Lloyd.

Don D. tinha um estilo muito peculiar, suas composições refletiam uma atmosfera fúnebre, que se tornou sua assinatura alguns anos depois.

Tommy McCook já tinha a reputação de um grande músico, até mesmo por ser mais velho que os outros instrumentistas. Ele costumava ser chamado sempre por Coxsone, que queria formar um grupo de base. No começo McCook evitava Coxsone porque não estava interessado em tocar Ska, ele já tinha uma carreira solo com intenções de focar no jazz, assim como seus parceiros comtemporâneos da Alpha Boys que foram para América e para Europa. O que fez ele aceitar a formar o grupo não foram as negociações com Coxsone, mas sim a qualidade dos músicos de Ska que estavam surgindo. Quando Tommy escutou “Schooling the Duke”, música que caiu no gosto popular na época, ele imediatamente ficou fascinado com as performaces de Don Drummond, Bobby Gaynair e, especialmente, com as improvisações de um jovem trompetista chamado Johnny Moore.

Já o guitarrista Ernest Ranglin, conseguia ajudar na criação e gênese da batida do Ska, e ao mesmo tempo que estava inserido nessa nova cena musical, ele não abandonou sua carreira como jazzista. Ele é fortemente influenciado pela guitarra Wes Montgomery, e também pelo sax de Charlie Parker. Ele implantou um estilo moderado de tocar notas de Mento junto com ataques rápidos de acordes jazzísticos ousados. Ranglin consegue tocar do mais complexo ao mais simples, com solos que deixam qualquer um de queixo caído. Ele começou a arte de tocar guitarra ainda muito novo. Seus tios que tinham certa destreza na guitarra e no ukulele, deram as primeiras lições para Ernest. Aos 14 anos ele começou a estudar seriamente, e no mesmo ano já começou a tocar na banda de ninguém menos que Val Bennett, como um menino prodígio, isso na metade dos anos 40. No início dos anos 50 ele se juntou a organização de Eric Deans, fazendo turnê pelas Bahamas. Quando estava se apresentando em Nassau, o guitarrista Les Paul ouviu Ranglin tocar e ficou encantando com o jovem talento jamaicano.

Ranglin certamente foi um dos criadores do Ska, que provavelmente começou em 1958. Guiados por Coxsone Dodd, os músicos tocavam Rhythm and Blues americano, modelado para o estilo jamaicano, eles criaram um boogie-blues que suingou até se transformar no Ska. Tudo culpa de Coxsone, que encorajava os jovens músicos a seguir novas direções, e não simplesmente imitar os americanos. Um aspecto importante da personalidade do Ska é sua sensibilidade melódica, criação clara dos jazzistas jamaicanos. Na parte rítmica, uma fonte de pesquisa muito forte acontecia na própria Jamaica. Lloyd Knibbs, baterista dos Skatalites, introduziu o estilo burru de bater na caixa, influência dos tambores nyabinghi de Count Ossie.

Oswald “Count Ossie” Williams é o criador da batida de tambores rastafari, chamada nyabinghi, ele começou sua jornada como músico em 1949, aprendendo burru com o professor Brother Job. Burru era uma seita underground que mantinha viva a batida africana na cultura musical jamaicana. Ossie desenvolveu tamanha habilidade que o tornou um baterista sem baquetas, ele utilizava as mãos de forma maestral. Ele era um imã que atraía jamaicanos interessados em música, de várias raças e classes, para seu acampamento Adastra Road Rasta, em East Kingston. Até os políticos do governo e a oposição parlamentar dos anos 60, reconheciam Count Ossie como um grande músico, tanto que em 1966, quando o imperador da Ethiópia Haile Selassie visitou a Jamaica, o conjunto de Count Ossie foi convidado para se apresentar para o imperador. E não era só na ilha que ele era reconhecido, no começo dos anos 60, o majestoso pianista de jazz Duke Ellington, em visita a Jamaica, ficou encantado com a percussão de Ossie, e não desgrudou dele durante alguns dias, inclusive chegaram a tocar juntos em apresentações particulares.

A reputação de Count Ossie era tão grande que os melhores jazzistas jamaicanos costumavam visita-lo em seu acampamento para jam sessions. A maior parte dos membros do Skatalites também vivia em East Kingston e passava o tempo comendo, dormindo, fumando e improvisando no acampamento de Count Ossie, misturando jazz com nyah music. Em entrevistas, Lloyd Knibbs já mencionou que seu primeiro instrumento foi o tambor de mão, que ele tocava no acampamento. A influência que Ossie gerou em Knibbs pode ser mensurada em gravações dos Skatalites como o standard “Addis Ababa”, até faixas mais obscuras como a mística “Smiling”, composta por Don Drummond.

Durante a metade, até o final dos anos 50, antes do nascimento do Ska e da maturidade da indústria fonográfica jamaicana, era notável a queda de público nas apresentações ao vivo dos grupos de jazz. Ao mesmo tempo, vinha crescendo o número de sistemas de som que faziam festas em todas partes da cidade, e tocavam muitos discos de rhythm & blues, considerado um som novo e excitante, mas que diminuia o status urbano do jazz, jogando-o para segundo plano. A cultura sound system, tal como conhecemos hoje, começou no final dos anos 40, como forma de entreter os pobres e negros com blues americano, em um ambiente dançante. Quando o rhythm & blues iniciou sua ascensão como música popular, os sistemas de som passaram a selecionar os principais artistas do gênero a balde, destacavam-se Fats Domino, Bobby Bland, Louis Jordan, Chris Kenner, Johnny Ace, Amos Milburn, Roscoe Gordon, e alguns sons latinos como Prado Perez, Gerald Wilson, Manchito e outros.

Os sound systems tocavam esse tipo de música underground, e de qualidade, que não tinha lugar nas rádios jamaicanas, que só apresentavam ao público as estrelas americanas Frank Sinitra, Pat Boone, Perry Como, etc. As gravações de mento que já estavam estourando começavam a ganhar espaço nas última horas de seleção dos sounds. Era também comum, ver o grupo de Count Ossie se apresentar nesses bailes, ele passou a tocar um estilo de nyabinghi que se aproximava da música americana, parecido com a gravação de “Oh Carolina”, dele ao lado dos Folkes Brothers. Já era uma música totalmente diferente do que os rastas estavam acostumados a ouvir. As apresentações de Count Ossie e as seleções de mento, colocavam a música indígena em um patamar importante dentro da música popular urbana.

Coxsone's Downbeat, Duke Reid's Trojan e Tom the Great Sebastian formavam a tríplice coroa dos sistemas de som do começo dos anos 1960, mas também existiam os sounds pequenos que não tinham grandes caixas, porém a seleção era recheada de preciosidades. Cyril Henry Braithwaite, que ficou conhecido como Count C, ou melhor “The Wizard of the West”, foi um desses pequenos que brigavam de igual para igual com os reis da cena. Ele começou ainda nos anos 40, quando a rádio não tinha chegado a ilha. Count C é um personagem seminal para a cultura sound system, e jamais deve ser esquecido, como ele mesmo costumava falar, “a música não tem fim”.

A rivalidade entre os sound systems era tão grande que fez com que alguns desses soundmens virassem produtores, podendo assim tocar nos sounds músicas exclusivas, gravadas e lançadas por eles mesmos. No final dos anos 50 os sistemas de som começaram a tocar rhythm blues com uma forte influência de mento, gravações como “Easy Snappin”, do pianista Theo Beckford, e “Oh Carolina” de Ossie & Folkes Brothers, são sem dúvida, os embriões da música popular jamaicana. Em 1962, ano de independência, um sentimento de orgulho tomou conta de todo país. A vontade de tocar e mostrar a música genuinamente jamaicana cresceu de tal forma, que o Jazz ficou quase esquecido. Poucos foram os que nunca deixaram de tocar o bom e velho jazz, é o caso do grande Sonny Bradshaw, que, década após década, continuou a fazer concertos de jazz. Mas de certa forma o jazz estava bem representado, além de Bradshaw, era no Ska que o ritmo sempre se manteve onipresente. Johnny Moore estava ali para representar Dizzy Gillespie, até chegou a ganhar o apelido de 'Dizzy' alguns anos depois, Roland Alphonso não deixava ninguém esquecer de Charlie Parker, e McCook, com sua forte inspiração em John Coltrane, demonstrava a cada solo que o jazz nunca deixaria de existir na história da música jamaicana.





Texto por Luís Cruz – Y&M

Foto: Joe Harriott

Um comentário:

  1. Curto muito esse viés histórico por que vocês apresentam a música jamaicana... Matador! Gracias!

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