17/05/2010
às 22:04 \ Feira LivreA Virada que não está no papel
Bruno Abbud
Marcelo Sono acordou antes do meio-dia no último sábado. Trocou a roupa amarfanhada, dirigiu uma Kombi branca pelos seis quilômetros que separam a Vila Mariana da Praça da Sé, no centro da capital paulista, e ali desceu com quatro amigos. Alguns moradores de rua notaram o movimento e ofereceram ajuda quando os jovens começaram a descarregar as três toneladas de equipamentos de som que transbordavam do interior do veículo para a calçada da rua Irmã Simpliciana. Era o dia da Virada Cultural paulistana. Por isso, os guardas civis metropolitanos e os fiscais de trânsito que passavam pelo local relevaram a algazarra armada em frente do boteco de dona Vânia.
Sono, Greg Fernandes, Carlos Pappa Neggo, Luis e Jurássico, todos com menos de 25 anos, pagam até R$ 2 mil pelo disco de vinil que colocam na velha vitrola ligada ao poderoso aparato acústico ─ verdadeiras paredes formadas por caixas de som, inspiradas nos antigos sound systems jamaicanos. Sobre a melodia que sai das caixas, cantam um repertório de reggae clássico. Desde 2008, o “Jurassic Soundsystem” não está na programação da Virada Cultural. Não oficialmente.
Depois de insistentes solicitações, o grupo desistiu de esperar pela resposta da prefeitura e resolveu o problema por conta própria. Fundaram a Virada Ilegal, que neste ano chegou à terceira edição. O evento, divulgado pela internet, acontece graças a um pedaço de calçada livre e uma tomada. Dona Vânia troca a energia elétrica de seu pequeno estabelecimento pela fidelidade do público. Num só dia, vende mais cervejas do que durante o ano todo. A festa se repete todo mês naquele local. Em maio, com a Virada Cultural, a exposição do grupo se amplia notavelmente. No embalo da madrugada organizada pela prefeitura, poucas pessoas percebem que aquela é uma Virada que não está no papel.
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